Muito
religiosa, podia ter nascido Maria de Lourdes (11/02), mas Vovó Rosa decidiu-se
por Suzana, que significa “pura como um lírio” e o vovô polonês enrolou a
língua e registrou Zuzana, com "z".
Ainda
bem que o segundo nome não tinha como errar: G e n o v e v a.
Difícil
mesmo era o sobrenome – Dzworniarkiewicz – 16 letrinhas bem trabalhadas que só
ela sabia pronunciar.
Nasceu
em meio a cinco irmãs e apenas um irmão, Isidoro, o bendito fruto.
Infância
difícil, interior, chão batido e mais de 10 km a pés descalços para a aula de
catequese.
Queria
ser freira. Vovô deixou, mas vovó não aprovou.
Fugindo
dessa criancice pesada, cresceu logo e deu um jeito de vir para a cidade.
Com
17 anos, conseguiu emprego em uma casa de família, na capital paranaense e lá ficou, por anos e anos.
Loira,
tímidos olhos azuis, encantou-se por rapaz moreno, de olhos escuros e sorriso
largo.
Acabaram
noivos, mas a religiosidade nunca deixou de ser sua melhor companhia.
A
casa que lhe acolhera ficava em frente às vermelhas paredes do quartel do Corpo
de Bombeiros de onde começou a perceber olhares que se repetiam toda vez que ia
varrer o quintal ou lavar as calçadas.
Noiva
que era, não dava bola, mas o admirador secreto era insistente e ousado. Só
esqueceu de dizer que também era comprometido.
Olhares
aqui, sorrisos dali, desmancharam os compromissos anteriores e passaram a se
conhecer mais de perto.
Acabou
indo morar com a família dele – pais e uma irmã, Olívia, que hoje ainda vive o
auge dos seus 96 anos, sem grandes recordações.
Novos,
mas também difíceis tempos aqueles! Era tratada como empregada, só que agora
sem remuneração e já passava dos 30.
O
mês virou e a dita não desceu. Bingo!!!
E
a correria para o casório começou.
Cartório,
igreja, aluguel do vestido de noiva, e de presente, um lindo bolo de presente
da Dona Angelca.
Ela
mesma se arrumou e lá se foram os três para selar o matrimônio.
Em
poucas fotos que resultaram do evento de 31 de maio, dava para perceber o olhar
torto do noivo. Vinho Sulino em excesso foi a causa e passos trançados, a
consequência.
O
dinheiro que ganhavam era pra comida e a curiosidade era sobre a cor dos olhos
da menina.
Novembro
nasceu e a primogênita chegou!
Olhos
cor de café sem leite...
Época
de morangos e o bolo de um aninho foi em forma de coelho, coberto de coco e com
um laço vermelho no pescoço.
E
assim crescemos com essa mãe trabalhadora, generosa e atenciosa, apesar da
dificuldade que tinha para abraçar.
Depois
entendemos o motivo. Desconhecia! Carecia de afeto.
Tinha
o sonho de saber costurar.
Mal
sabia ela, que retalho a retalho, passou a vida remendando o sonho de muita
gente.
Quando
criança, andava descalça. Já adulta, calçou pés nus e vestiu corpos carentes de
vida e amor.
Seu
lema era a bondade, a caridade, a compaixão, a solidariedade e o colocar-se no
lugar do outro, mesmo sem saber o que significava a palavra empatia.
Sofreu
violência física, psíquica e verbal, mas
o seu espiritual resistiu bravamente às injúrias, às calúnias, aos socos e
pontapés.
Um
dia o olho direito arroxeou, criou coragem e denunciou. Mas aí veio o medo a
lhe assombrar o ouvido e abafou sua voz.
Sempre
fez da sua religiosidade o seu pilar. Ali se prostrou, ali chorou e ali se
levantou e seguiu em frente, ainda mais forte!
Não
bastasse as dificuldades da vida, seu filho mais novo seguiu os caminhos do
pai, e por vezes amorteceu sua dor como
sequela da embriaguez alheia.
Resiliência era outra palavra que ela não conhecia, mas pode ser o
maior exemplo a ser guardado na caixinha das superações.
Conversadeira,
vivia sorrindo, contando causos e puxando conversa. Às vezes, até um pouco
inconveniente, mas foi o caminho que encontrou para disfarçar a tristeza e a
angústia que sufocavam seu coração. De tão grande não
cabia no peito e precisava alcançar o outro, como num abraço apertado.
Amava
ajudar as pessoas e fez disso o seu lema. Foi muitas vezes explorada, mas seu coração era MAIOR e seguia emprestando aqui,
ajudando ali, construindo acolá.
Nossa!
Como se orgulhava de ter estudado um pouco de francês, oportunidade que
aproveitou na igreja que frequentava e que ficava perto da casa onde
trabalhava.
Passou
em concurso público. Trabalhava na copa de uma instituição de saúde, fazendo
cafezinho e comprando lanches para os funcionários.
Certa
vez, no caminho para a padaria, um cão a avançou. Um motivo para visitar a
benzedeira Dona Angelina, que sabia fazer cachorro de cera aparecer na parafina
aquecida.
Apreciar
os mais variados tipos de balas que as Lojas Americanas ofereciam também era um
sonho que se concretizava toda vez que fulana ou beltrano careciam de conforto
num dia difícil.
E
quando os filhos estavam com dor de cabeça, então? Era só ela passar a língua
na testa deles e cuspir por três vezes que a dor ia embora...não precisava nem
chamar a Neusa.
Porque
MÃE é assim! Opera milagre e faz mágica o tempo todo!
Marca
pra sempre!
Mulher,
filha, irmã, tia, vizinha, esposa, funcionária pública – GRANDIOSA em todas as
instâncias!
Nasci
morena, olhos castanhos e cabelo escuro, mas tive a bênção de ter escolhido
essa mulher especial como minha mãe. Vestida de um azul que espelhava ainda
mais o céu, foi o lugar com o qual sempre se identificou e local para onde
retornou em 06.12.2012.
Depois
de tanto sofrimento e tanto amor ao próximo, seu frenético coração descansou.
Mas
o lírio ainda vive e pulsa, puro de corpo e alma!
Perfuma,
dorme e ainda me acolhe em seus braços.
(Flor-de-lis é a representação de um lírio utilizado antigamente nos brasões e escudos da realeza francesa, associada em especial ao rei Luis VIII, quem a utilizou primeiramente em um sinete. A flor-de-lis é símbolo de poder, soberania, honra e lealdade, assim como de pureza de corpo e alma).
Feito
canção de ninar.
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