segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Chove chuva




Desde pequena tenho uma forte ligação com a chuva.

Às vezes boa, outras nem tanto, mas profunda!

Quando criança, lembro que eu dava tudo por um dia sem ir à escola, num dia de chuva.

Já se passaram 4 décadas e ainda trago uma imagem como se fosse ontem... minha mãe saindo pro trabalho, trancando a porta e nos deixando seguros, em casa, num dia de chuva, na companhia de uma rechonchuda bacia de pipoca.

Chuva e pipoca, paixões antigas!

Chuva, água, aconchego e apesar de eu não fazer questão de entender, apenas SENTIR, talvez essa confortável sensação tenha a ver com minha morada de nove meses no útero de minha saudosa mãezinha.

Por outro lado, tenho medo de água. Tenho fobia de uma piscina onde a água chega na altura do meu pescoço, e no mar, me aventuro apenas a brincar no encontro das ondas já tocando a areia, mas ainda assim, me encanto com a água salgada que tempera a alma.

Outro dia comentei com os amigos que chuva tem gostinho de bolo e cheirinho de pipoca e aí entram aquelas gostosuras que hoje me aventuro a fazer, na certeza de que um bom chá da tarde precisa dessa saborosa companhia.

Uma chuvinha quieta nos convida ao recolhimento, ao aconchego, à introspecção, e na presença de uma boa música nos leva a viajar, sem sair do lugar.

Sei que muitas pessoas não entendem esse meu esdrúxulo amor, principalmente num país onde o sol se faz cada vez mais imperativo, e pra fortalecer ainda mais esse meu relacionamento com o "tempo", ainda tive a oportunidade de viver por quase 3 anos numa ilha que também amo, mas onde o sol se esconde e reina apenas por poucas semanas no ano. Foi lá, na terra da "Tia Beth" que definitivamente aprendi a gostar dos dias nublados e a não ficar deprê com os dias de garoa fina.




Outra doce lembrança!!!

Eu, que sou amante incondicional das CORES, mergulhei num curso intensivo pra compreender e aprender amar o cinza que toma conta de talvez 80% do ano daquele lugar onde fiz morada por muitas vidas...

Voltando ao país tropical onde vivo hoje, o sol é mais que bem-vindo  (e também ocupa um lugar especial no meu coração),  mas no ranking dos sites de previsão do tempo, dias chuvosos não emplacam muito no topo das listas como uma boa surpresa, mas continua no TOP 10 das minhas boas recordações.






terça-feira, 23 de setembro de 2014

CORação





A noite vai chegando de mansinho, 
e aquele coração que já se encontrava sem cor, 
se faz mais cinza ainda.

Sente falta da lua, que não veio,
e o brilho das estrelas também não está lá pra acolher sua tristeza.

Estranheza.

Um vazio bate à porta, 
entra, e ela espera que ele não se demore, 
tome seu chá e vá embora...
mas entre um silêncio e outro,
lágrimas não convidadas se fazem presentes
e o chá se vê levemente salgado.

Inundado.

Pensamentos confusos
se aproximam e se afastam
sem saber se vão ou se ficam.

Respira fundo, acende uma vela.

Serena seu coração. 

De repente, o vento afasta a cortina 
como que querendo revelar algo. 

Vai até a janela e se depara com a lua 
que resolveu aparecer pra desejar um lindo e cheio Boa Noite.

A tristeza vai minguando, 
dando lugar a um sentimento novo, 
crescente...

Fecha a janela. 
Despede-se do vento, da lua, das estrelas e 
dá adeus à tristeza.

Apaga a vela e dorme feito um anjo, 
esperando sonhar com a alegria de viver.

sábado, 13 de setembro de 2014

Café com poesia


Seja com café
que às vezes dá azia,
seja com amor e fé,
seja com poesia,
um  ingrediente que não pode faltar
no nosso dia a dia
é o bom humor
sempre com muita fantasia.


Unidade





Lua cheia
Janela entreaberta
Cortina alheia

Roupas pelo chão
Sedução
Dois corpos que se fundem
Atração

Prazer que
Contorce
Retorce e
Torce

Arrepio
Olho no olho
Desejo
Frio na barriga
Borboletas estomacais
Irracionais

Coração acelerado
Abraço desesperado
Beijo já esperado

Dois seres num só
Côncavo e convexo
Reflexo de um nó

Agudo ou circunflexo
Complexo
Desconexo
Com ou sem nexo
Perplexo

Vidros e corpos
Suados
Gritos e sussurros
Exalados
Atenuados



Na terra da Tia Beth







Não eram só os olhos verdes que me chamavam a atenção naquele rapaz exótico, de cabelos longos, geralmente presos num trivial rabo de cavalo e um brinquinho na orelha direita. Todo ano ele dava um pulinho, ora em Paris, ora em Nova Iorque , ora em Londres, simples assim, com uma freqüência possivelmente maior da que me fazia pegar o busão e seguir para o litoral paranaense.

Acho que foi aí que meu coração começou a pulsar mais forte pela capital britânica e toda vez que ele discretamente anunciava aos mais próximos o destino de suas férias, eu  queria ser um pé de meia furada pra seguir junto com ele no meio da bagagem.

Diante dessa impossibilidade, eu sofria, e como sofria!!!

Sofria, mas não desistia e o vôo para a realização desse sonho alto um dia chegou.

Comemoração digna de rainha, com direito a frio na barriga, suor frio, coração disparado, nó na garganta, orgulho de dever cumprido e prazer de sonho realizado.


Lá se foram 23 anos de nossas vidas e a paixão por essa ilha de céu nublado e gente fechada ainda tem lugarzinho reservado no meu coração, cercado de saudade por todos os lados...

Cheirinho de mãe





Sempre gostei de pão! Quentinho então, uma verdadeira tentação!

Cresci vendo minha mãe fazer pão em casa e o final de tarde de sábado era sempre agraciado com aquele cheirinho maravilhoso que se misturava ao cheiro de faxina feita e da cera Canário amarelo, em pasta, que se confundia com o por do sol que também era sempre convidado para o lanche.

Desafio mesmo era esperar o pão esfriar um pouco e tudo o que conseguíamos era deixar de lado nossas brincadeiras de criança e mal lavadas mãos, sentávamos à mesa extasiados diante daquela cena de manteiga derretida.

Chá Mate Leão foi sempre o meu preferido acompanhante e quente ou frio fazia as vezes do café com leite, nem sempre presente, mas a Doriana não podia faltar.

Cansada, sigo escrevendo, e de repente percebo que  meus olhos descansam em um porta retrato na estante, tendo como protagonistas eu e minha mãe.

Minha família sempre foi carente de lembranças e fotografias, mas como eu gosto de sair por aí tirando foto feito japonês em viagem de férias, sempre que a visitava, levava a câmera pra passear.

Geralmente ela era arredia a fotos, ora porque a roupa estava inadequada, ora porque o cabelo estava despenteado, ora porque não tinha passado perfume ou porque não tinha escovado os dentes. Mas naquele dia ela acabou cedendo.

Era o mês de outubro, aniversário do meu irmão, e meu pai também tinha sido convidado para o almoço, que tinha como principal coadjuvante, um delicioso empadão de frango que só ela sabia fazer.

Lembro que tivemos o almoço mais harmonioso que nossa pequena e fragmentada família já havia  vivenciado, faltando apenas a presença do meu querido irmão que mora do outro lado do oceano. De repente, como que num toque de varinha de condão, o telefone tocou e feito aquela pecinha do quebra-cabeça que faltava, ele também se fez presente e a saudade doeu no peito.

Depois de quase três décadas separados, minha mãe se deixou fotografar ao lado do meu pai e tiramos muitas fotos... mal sabíamos que seria seu último flash.

Exatos dois meses depois ela partiu pra junto das estrelas e cada vez que a noite se faz escura, ela brilha nos lembrando que nasceu e morreu pra brilhar.

Sua presença se faz ausente e seu lugar na mesa permanece vazio, mas minha alegria de criança ao ouvir aquele cheirinho de pão saindo do forno, ficará pra sempre no caderninho rosa de minhas boas lembranças, eterno como as fotos que pintam de infinito nossos melhores momentos.




Assovio



Feriado. 

Quatro e meia da manhã, e logo eu, que sempre gostei da chuva embalando meus sonhos e já declarei aqui o meu amor pelo vento, que eu costumava levar pra passear, acordei  assustada, com aquele assovio nervoso que estava me deixando apavorada.

Eu só conseguia pensar no telhado e nas frágeis telhas recém-trocadas, tão ingênuas e inexperientes.

Ainda ontem liguei a TV que mostrava a destruição de casas e vidas resultantes de mais um tornado nos Estados Unidos e hoje o vento incessante me despertou de um sono tranquilo que era pra estar de folga.

Medo! Talvez seja essa a palavra do momento... e eu que pensava que isso era coisa de criança no escuro.

Acendo uma vela. Faço uma prece.

E aos poucos ele vai de acalmando, e eu também.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Um país sem voz, que grita



Quinta-feira à noite. Aniversário de uma amiga que completa 51 anos de boas ideias, e eis que tomo conhecimento de uma, das GRANDES!

Livraria lotada, poucas cadeiras, e à frente de um maravilhoso projeto, JP, fotógrafo, 32 anos, solteiro e pai. Alto, moreno, vestido como um afegão, tenta controlar o nervosismo em sua palestra de número 1!

Relata que sua carreira é recente e iniciou em 2010, fotografando aniversários de 15 anos, casamentos e bodas. De repente, decidiu que queria fazer foto documental. Encaminhou mais de 30 currículos e recebeu apenas uma resposta, destino Afeganistão, ao qual não pode dizer não.

Embarcou no final de março e passou 26 dias em Cabul.

Ao chegar no aeroporto, ficou sabendo que queriam explodir o avião em que estava, recheado de sul-coreanos. Ao pegar o que chamavam de “ônibus”,  para chegar ao saguão do aeroporto, percebeu que o veículo não tinha porta e estava completamente alvejado... foi aí que rezou para pelo menos chegar ao hotel.

Conseguiu pegar um táxi (todos são Corolas brancos, da Toyota) e ao chegar no hotel onde tinha reserva, simplesmente não pode se hospedar pois o local havia sido bombardeado.

Seguiu então para outro Hotel, onde pôde se sentir um pouco mais seguro, se é que isso seria possível.

Precisava sair às ruas para fotografar e logo nos primeiros dias já foi preso, numa detenção que durou 5 horas e 15 minutos.  Quinze minutos de reclusão e 5 horas de muito chá como os policiais. Dizendo que era do Brasil e tentando se comunicar com seu bad English, acabou por fazer amigos, ganhando, inclusive, uma roupa típica da região, vestimenta essa que o acompanhou pelos 22 dias restantes de sua aventura.

Fez muitas fotos e por trás de cada uma há uma história a contar.

A que muito me impressionou, foi a do senhorzinho que “batia o tapete” para que o visitante pudesse entrar. Em volta de um cercadinho de pedras, com os chinelos/sapatos na entrada, usou o restinho de água que possuía para lavar as mãos e poder cumprimentar aquele que só queria autorização para tirar uma foto. 

Detalhe, ali era sua casa e estava sendo hospitaleiro ao oferecer ao visitante sua última xícara de chá.  Uma generosidade que comove.

Crianças saindo da escola, felizes apesar de tudo, mulheres cobertas, mas sem esconder uma vaidade ainda oculta, homens procurando emprego, animais dividindo lixão com crianças famintas, ruínas, pobreza, lágrimas, indignação.

Tudo registrado de uma forma bastante peculiar, num olhar que vai além da câmera fotográfica,  chega no coração!


P.S. Dedico esse texto ao meu irmão, que não mora no Afeganistão, mas fez morada do outro lado do oceano e cuja semelhança física com o protagonista dessa história é gritante e fez meu coração doer de saudade...




Sonhos & Sonhos




Madrugada
Ouvidos cerrados

Lembrança alada
Sono tranquilo
Gritos negados
Sonhos por quilo




Tato aguçado
Olfato confuso
Paladar açucarado
Goiabada, doce de leite, creme, chocolate
Doce sonho doce